
Como sintomas negligenciados na adolescência, na fase adulta e na menopausa impactam milhões de mulheres
Um Tabu que Precisa Cair
A endometriose é uma das condições médicas mais subdiagnosticadas do mundo. Estima-se que 190 milhões de mulheres vivem com a doença, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Apesar de ser associada ao ciclo menstrual, ela não é “apenas uma cólica forte”. Trata-se de uma doença crônica que pode afetar órgãos como intestino, bexiga e até ossos, causando inflamações, lesões e dor incapacitante.
Infelizmente, muitas mulheres ainda ouvem frases como “é normal sentir dor menstrual” ou “isso vai passar”. Esse cenário contribui para um atraso de 5 a 10 anos no diagnóstico, período em que a doença avança silenciosamente. Neste artigo, exploraremos como a endometriose se manifesta em diferentes etapas da vida, os desafios para identificá-la e por que a conscientização é urgente.
O Que é Endometriose?
A endometriose ocorre quando células semelhantes ao endométrio (tecido que reveste o útero) crescem fora dele, como nos ovários, trompas, intestino ou parede abdominal. Durante a menstruação, essas células sangram, desencadeando inflamação, aderências e cicatrizes que podem comprometer órgãos próximos.
Segundo o Dr. Patrick Bellelis , especialista em endometriose do Hospital das Clínicas da USP:
“A doença pode surgir em qualquer idade, mas é mais comum entre 30 e 40 anos. Muitas mulheres levam mais de cinco anos para receber o diagnóstico, o que agrava a progressão da doença ”.
A condição é classificada em quatro estágios (I a IV), mas a gravidade dos sintomas não está diretamente ligada ao estágio. Uma mulher com lesões pequenas pode sentir dores intensas, enquanto outra com lesões extensas pode ter sintomas leves.
Sintomas que Passam Despercebidos
A endometriose é conhecida por sua capacidade de se camuflar. Seus sintomas variam conforme a localização das lesões e a fase da vida, o que dificulta o reconhecimento. Os principais sinais incluem:
- Dor pélvica intensa (especialmente durante a menstruação);
- Infertilidade ou dificuldade para engravidar;
- Dor durante relações sexuais ;
- Sangramento urinário ou intestinal ;
- Fadiga crônica e alterações intestinais.
Um estudo publicado no Journal of Pain Research revelou que 65% das mulheres com endometriose relatam impacto severo na qualidade de vida , incluindo limitações sociais, emocionais e profissionais.
Adolescência: Quando a Cólica Não é “Coisa de Menina”
A endometriose pode se manifestar logo após a primeira menstruação (menarca). No entanto, sintomas como cólicas intensas, dores ao urinar ou evacuar são frequentemente subestimados.
“Na adolescência, é comum normalizar a dor menstrual. Cólicas incapacitantes, no entanto, são um sinal de alerta ”, explica o Dr. Bellelis.
Nessa fase, a falta de vida sexual ativa mascara sintomas como dor durante o contato íntimo, enquanto a infertilidade ainda não é uma preocupação. Além disso, muitos médicos hesitam em investigar a endometriose em jovens, optando por analgésicos em vez de exames específicos.
Como agir:
- Registre os sintomas em um diário (intensidade da dor, dias do ciclo, outros sintomas);
- Busque um ginecologista especializado se houver sangramento excessivo ou dores que atrapalhem atividades cotidianas.
Fase Adulta: Entre a Dor e a Infertilidade
Nos anos férteis, a endometriose muitas vezes se revela de forma mais agressiva. Cólicas que mudam de padrão , dor durante a relação sexual e dificuldade para engravidar são sintomas comuns.
Segundo Bellelis:
“Cólicas que limitam a rotina ou apresentam características novas devem ser investigadas. Muitas mulheres só descobrem a doença ao tentar engravidar ”.
A condição está ligada a 30% a 50% dos casos de infertilidade feminina , segundo o Journal of Assisted Reproduction and Genetics . Lesões nos ovários, trompas ou útero podem dificultar a concepção natural, exigindo tratamentos como fertilização in vitro (FIV).
Tratamentos possíveis:
- Medicamentos (anticoncepcionais, agonistas de GnRH);
- Cirurgia para remover lesões;
- Acompanhamento multidisciplinar (nutrição, fisioterapia, psicologia).
Menopausa: Um Alívio que Não Acontece para Todas
A queda hormonal na menopausa pode reduzir sintomas em algumas mulheres, mas não é uma regra . “A endometriose pode persistir após a menopausa, especialmente em casos de lesões profundas ou produção residual de estrogênio ”, alerta Bellelis.
Nessa fase, complicações como obstrução intestinal ou lesões na bexiga podem surgir. O acompanhamento médico permanece essencial para evitar danos irreversíveis.
O Longo Caminho para o Diagnóstico
O diagnóstico da endometriose envolve:
- Histórico clínico detalhado ;
- Exames de imagem (ultrassonografia, ressonância magnética);
- Laparoscopia (único método definitivo para confirmar a doença).
Um estudo da Journal of Endometriosis revelou que 65% das pacientes consultam pelo menos três médicos antes de receber o diagnóstico correto . Esse atraso está ligado à falta de conhecimento sobre a doença e à normalização da dor feminina.
Endometriose Não é uma Sentença
Apesar de crônica, a endometriose pode ser gerenciada com diagnóstico precoce e tratamento adequado. A conscientização é o primeiro passo para romper o ciclo de sofrimento silencioso.
Se você se identifica com os sintomas, não hesite em buscar ajuda especializada. A endometriose não define sua vida — e você não está sozinha.