Projeto Sucessores, da Atlas, promoveu 9 horas de debates sobre sucessão familiar e a perpetuação dos negócios do setor de matcon, tema que impacta no desenvolvimento econômico e na geração de milhares de empregos. Evento, realizado quarta-feira (24), no Hotel de Deville, em Porto Alegre, contou com a participação de mais de 90 executivos de empresas do segmento de materiais de construção do Brasil e América Latina.
Embora passando por momentos de retração em comparação aos anos de 2020/2021, incertezas no curto e médio prazo, os desafios do setor de matcon vão além dos números da micro e macroeconomia e da conjuntura política do Brasil. Com aproximadamente 140 mil varejistas e 1000 atacados de diferentes portes – a maioria familiar -, o segmento de materiais de construção está atento à sobrevivência dos negócios por várias gerações e ao seu papel social de criar milhares de empregos. Com essa responsabilidade de entregar alternativas para a perpetuação das empresas, nasceu o Projeto Sucessores, da Atlas, marca referência em soluções para pintura, construção e casa, com matriz em Esteio/RS. A 2ª edição do evento, que se iniciou dia 24 e segue até dia 26, reúne um terço do PIB (R$ 45 bilhões) da cadeia de varejo e distribuição do Brasil e da América Latina. “Sucessão não é tema apenas econômico, mas socialmente importante para perpetuar a fonte de receita, de planos e sonhos de vida de milhares de pessoas e de comunidades, onde as empresas estão inseridas, que dependem dos nossos negócios”, afirmou Márcio Atz, diretor geral da Atlas, indústria que atua há 57 anos no mercado e faz parte da holding InBetta, na abertura do evento, quarta-feira, no Hotel Deville, em Porto Alegre.
Durante 9 horas de apresentações e debates com renomados executivos do mercado, mais de 90 CEOs e sucessores dos principais negócios do país e da América Latina fizeram uma imersão sobre gestão de sucessão, governança patrimonial, fusões & aquisições e os desafios do varejo contemporâneo, temas considerados estratégicos para a longevidade dos negócios ou ainda recentes para o mercado brasileiro, como intraempreendedorismo, Family Office e dropshipping. Para o presidente das Empresas Inbetta, Eduardo Bettanin, a principal preocupação ao longo da gestão é a sobrevivência. “As empresas devem estar sempre atentas a oportunidades, mas também a ameaças, que fatalmente estão sujeitas devido aos problemas de toda espécie na economia. A Atlas trouxe para o centro do debate o tema sucessão, que é uma oportunidade/ameaça, por isso faz-se necessário abordar essa questão, fator decisivo para traçar as diretrizes futuras e que permitirá que a empresa cresça e se perpetue”, disse o CEO, acrescentando que o Projeto Sucessores é uma iniciativa de sucesso de compartilhamento de conhecimentos e experiências em prol do desenvolvimento da cadeia de materiais de construção. Na quinta (25, os participantes conheceram a fábrica da Atlas, em Esteio, e depois seguiram para a Serra gaúcha, onde o Projeto Sucessores se encerra na sexta-feira. O Projeto Sucessores conta com parceiros organizadores: Coral, Thomson Reuters, Adere, Amanco, Jimo, Mundial Prime, Quartzolite e Soprano.
Sucessão não significa encontrar um substituto para o fundador dentro da família
A novela Terra e Paixão, escrita por Walcyr Carrasco, explora o tema sucessão como se a decisão acertada fosse a simples escolha paterna sobre qual o filho (o mais velho ou o que tem mais influência) a ser indicado a comandar os negócios. Mas o rito de transferência de poder passa bem longe da ficção. Embora parte dos fundadores desejaria que seus filhos, irmãos e demais familiares atuassem e aumentassem seu empreendimento, a palavra aptidão é a ordem vigente no mundo empresarial. Para Magda Geyer Ehlers, fundadora do Instituto Sucessor, a sucessão sempre foi um desafio, porém a diferença é que, agora, existe uma visão mais ampla das possibilidades e caminhos a serem seguidos. “Falar em sucessão não significa encontrar um substituto para o fundador dentro da família, mas desenhar um novo modelo de gestão e governança com diferentes pessoas e esferas que levarão a empresa para o futuro”, explicou ela no painel Gestão de Sucessão, do 2º Projeto Sucessores da Atlas.
O ditado “pai rico, filho nobre e neto pobre” reforça que a divisão do protagonismo é fundamental para a perpetuação dos negócios. Por isso, a tendência nas empresas tornou-se primeiramente pensar nas necessidades da companhia e selecionar pelo mérito, não somente pela relação parental. “Despertar o senso de pertencimento e conexão das diferentes gerações possibilita que cada um encontre seu lugar e, com isso, seja protagonista da sua história”, explicou a fundadora, que é consultora de famílias empresárias há mais de 34 anos e conselheira em empresas do Sul e Sudeste do Brasil. Para Magda, a governança avançou muito nos últimos 25 anos e vai além da empresa, abraçando também a família e seu patrimônio. “Existem funções muito importantes fora da empresa familiar como a fortificação do legado, gestão do patrimônio familiar, iniciativas sociais e até mesmo novos empreendimentos”. Segundo ela, trata-se de um processo a ser conduzido com muita escuta para promover a integração e para que os dilemas sejam trabalhados de forma natural, evitando conflitos.
Ao citar que a sucessão é um processo longo, ele deve ser iniciado já na infância, estabelecendo os valores, os princípios da família, com o negócio em si para gerar uma relação de pertencimento, a fim de se plantar a semente da sucessão. Segundo ela, quando a primeira geração é de origem mais humilde, carrega essa herança de peso, de dificuldade, de sacrifício, razão pela qual, muitas vezes, os sucessores tem o sentimento de que a empresa roubou a cena e não querem passar pelo mesmo. “A empresa foi mais importante do que a família. O pai que não cantava nos aniversários, que nunca pôde buscar no colégio, ou a mãe que saia muito cedo de casa, não convivia com os filhos. Mesmo com orgulho do resultado nos negócios, a segunda geração não quer esse legado. E isso precisa ser trabalhado e ressignificado”, comentou. Da segunda para a terceira geração algumas dores e obstáculos já foram superados, mas há os dilemas: a participação da nova geração na empresa, como será feita e até que ponto os filhos estão preparados.
UM HERÓI – Para Magda, como a terceira geração já vem com uma base de riqueza, de sentimento, de pertencimento, a passagem do rito é mais tranquila, porém exige um planejamento estratégico da família empresária, como o que quer ser daqui 10, 15 anos, quantos familiares estarão na empresa, como será o crescimento do negócio, quem será o sucessor, por exemplo. “Estabelecer regras de governança ajuda a diminuir a expectativa de um super-herói. Só existe um herói na empresa familiar, o fundador. Depois dele, estamos falando da escolha de executivos competentes para dar continuidade ao negócio. A relação de confiança e de sintonia de sucessor e sucedido precisa ser gerenciada.” Citou, ainda, que o trabalho no âmbito da educação, união e harmonia dos familiares são extremamente relevantes para endereçar a sucessão de maneira descomplicada. “A gestão da sucessão é complexa, indo de valores intangíveis a questões objetivas e concretas”, disse.
Combinações, desafios dilemas fizeram parte do processo sucessório na Ferreira Costa, fundada em 1884 e hoje é o maior home center do Norte-Nordeste, contando com 6 unidades de negócios em operação e mais de 4000 colaboradores diretos, atuando nos estados de Pernambuco, Bahia, Sergipe, Rio Grande do Norte e Paraíba. Guilherme Costa faz parte da 4ª geração de gestão da empresa familiar e já prepara os membros da 5ª geração – do bisavô para o avô, do avô para o pai, do pai para Guilherme e para os filhos – para assumirem posições nos negócios. “A empresa e a família quase que se unem numa coisa só. Mas temos regras, como estudar e trabalhar fora, ganhar experiência e competências antes de entrar na empresa”, disse Costa, que acredita que somente o caminho da governança consegue vencer os obstáculos e dificuldades na trajetória da empresa, garantindo um processo de sucessão saudável e a perenidade dos negócios.
Um grupo econômico altamente profissionalizado. Assim, são as Empresas Inbetta. ”A profissionalização se tornou óbvia. Se é para administrar bem, precisamos de pessoas capazes. Hoje, estamos com a terceira geração trabalhando nos negócios. Todos passaram por um processo de conhecimento e de gestão”, afirmou O CEO Eduardo Bettanin. Os três jovens contam com a estrutura da empresa para fazer deslanchar novos negócios, mas ao mesmo tempo sentem o peso da cobrança de resultados de uma empresa maior. “É um processo muito rico de aprendizagem e de crescimento profissional”, acrescentou. Ao longo da quarta-feira, também foram apresentados os painéis Governança Patrimonial, com apresentação do Family Office com uma alternativa para a duração do patrimônio ao longo das gerações; Fusões & Aquisições como um mecanismo de sobrevivência da empresa familiar, e Os Desafios do Varejo Contemporâneo, que apontou que os negócios on-line vieram mesmo pra ficar e as empresas precisam se adequar para não perder negócios.
No intraeemprender, empresa familiar funciona como excelente incubadora
Marcelo Reichert, presidente do Grupo FCC, empresa familiar de Campo Bom/RS e há 54 anos no mercado, estava na linha de sucessão, mas optou por fazer um caminho diferente para chegar à presidência, cargo assumido há quase cinco anos. “Minha trajetória foi um pouco atípica, porque meu pai, o fundador do negócio, passou a presidência para um profissional que serviu como CEO da empresa durante oito anos, antes de ele passar o bastão pra mim”, contou ele. Morando nos Estados Unidos por 13 anos, período em que fez mestrado em Administração na Harvard Business School, bacharelado em Ciências Econômicas da Wharton Business School e bacharelado em Relações Internacionais da Universidade da Pensilvânia, além de ter trabalhado em Wall Street e em duas das principais empresas de consultorias estratégicas, Reichert tinha o sonho de criar um novo negócio, novas tecnologias e mudar o mundo. “Eu queria criar algo novo e tinha a empresa da família. Se eu voltar para o Brasil, vou conduzir o negócio que já existe e, por mais que eu faça um bom trabalho, vou ter orgulho do que fiz? Esses eram alguns dos dilemas”, contou. Ao retornar para o Brasil, aceitou o desafio em 2009.
Dentro de um novo modelo de gestão e seguindo o conceito de carreira em W – para crescer na empresa é preciso se tornar um supervisor, um coordenador, um gerente, um diretor e assim por diante – ele foi o primeiro intraempreendedor na empresa, ao trazer ideias para ajudar na transformação cultural da empresa e criar novos negócios que gerem resultados. Assim, surgiu o segmento de adesivos para o mercado automotivo. “Acabei virando um gerente de novos negócios e, aos poucos, fomos transformando o conceito da FCC fazer as coisas, se reinventando. Hoje, a empresa não faz nada do que fazia quando foi fundada. E daqui a alguns anos, não pode produzir o que produz hoje, pois vai deixar de existir. Esse é o grande desafio para uma empresa de ciência de materiais” explicou.
Para o CEO, a empresa familiar funciona como uma excelente incubadora, sendo um dos melhores lugares para qualquer sucessor construir algo novo em cima do que já existe. “Uma startup dentro de uma empresa familiar tem uma gama de oportunidades, como acesso a mercados, tecnologia, fornecedores, TI, RH, suprimentos, conhecimento de operações. Tá tudo à disposição. O que precisa é habilidade para vencer os obstáculos e as resistências, saber convencer as pessoas a serem parceiras e transformar um negócio familiar em uma excelente plataforma de criação de novos negócios”.
A FCC, empresa de ciência de materiais, faturou R$ 721 milhões em 2022, cifras que devem chegar a R$ 1 bilhão ano que vem, valor que deve ser duplicado até 2027. O crescimento exponencial vem sendo registrado nos últimos quatro anos e os planos de crescimento com produtos inovadores são bastante acelerados para o futuro. “Somos uma empresa que voa abaixo do radar no ouvido das pessoas, mas é muito difícil uma pessoa passar um dia sem interagir com algum produto nosso”, destacou Reichert. A empresa de Campo Bom, no pódio das 50 maiores do setor calçadista, tem mais de 200 projetos de inovação transitando. Nos últimos quatro anos, investiu R$ 60 milhões em tecnologia e desenvolvimento. Nos próximos quatros, o planejamento prevê R$ 150 milhões nesta área.