
Em meio a um cenário de transformação digital acelerada, onde a inteligência artificial (IA) ganha cada vez mais espaço nas operações corporativas, uma questão tem gerado ansiedade entre profissionais de diversos setores: qual será o impacto dessa tecnologia nos empregos e nas estruturas organizacionais? Um novo estudo da Korn Ferry, consultoria global de gestão organizacional, traz dados reveladores que podem acalmar parte dessas preocupações, ao mesmo tempo em que expõe desafios significativos na adoção e implementação dessas tecnologias.
O levantamento “Tendências de RH 2024-2025” aprofunda a análise do impacto da IA no mercado de trabalho, apresentando dados que contrariam algumas das previsões mais alarmistas sobre o futuro do emprego na era da inteligência artificial. Contrariando expectativas pessimistas, o estudo revela que 90% das empresas não têm intenção de reduzir suas estruturas no futuro, mesmo com a crescente adoção de tecnologias de IA. Apenas 9% planejam diminuir seu quadro de funcionários, enquanto somente 1% já implementou reduções atribuídas diretamente à implementação dessas tecnologias.
Esses números sugerem que, embora a IA esteja transformando profundamente as práticas de trabalho, desde o recrutamento até a gestão de talentos, seu papel parece estar mais voltado à complementação e potencialização das capacidades humanas do que à sua substituição. No entanto, o estudo também revela lacunas significativas no conhecimento e na implementação dessas tecnologias, indicando que muitas organizações ainda estão nos estágios iniciais de sua jornada de transformação digital.
O Paradoxo da Adoção: Potencial Reconhecido, Implementação Limitada
Um dos aspectos mais intrigantes revelados pelo estudo da Korn Ferry é o contraste entre o reconhecimento do potencial da IA e sua efetiva implementação nas organizações. Apesar do burburinho em torno da inteligência artificial generativa e suas aplicações no ambiente corporativo, a pesquisa mostra que a maioria das empresas ainda não desenvolveu habilidades aprofundadas nessa área.
Quando questionados se suas organizações possuem conhecimentos avançados em inteligência artificial generativa, apenas 1% dos respondentes concordou totalmente com essa afirmação. Em contrapartida, 36% discordaram, indicando uma ausência de expertise nesse campo, enquanto 38% se posicionaram de forma neutra, não concordando nem discordando. Esses dados revelam uma lacuna significativa de conhecimento técnico que pode estar limitando a capacidade das empresas de aproveitar plenamente os benefícios dessas tecnologias.
A resistência à adoção de soluções inovadoras também se reflete nos números de utilização: 74% das organizações afirmam não utilizar qualquer ferramenta de inteligência artificial generativa em suas operações cotidianas. Apenas 26% relatam o uso interno dessas tecnologias, um percentual surpreendentemente baixo considerando a onipresença do tema nos debates sobre o futuro do trabalho.
Entre as empresas que já incorporaram ferramentas de IA em seus processos, o ChatGPT lidera com 62% de adoção, seguido pelo Microsoft Copilot com 52%. Outras ferramentas como Viva (4%) e Bard (1%) apresentam taxas de utilização significativamente menores, enquanto 26% dos respondentes indicaram o uso de outras soluções não especificadas.
Barreiras à Implementação: Além da Resistência à Mudança
Segundo Rodrigo Accarini, Sócio e Líder da área de Soluções Digitais no Brasil da Korn Ferry, diversos fatores contribuem para a lenta adoção da IA nas organizações, apesar de seu reconhecido potencial para otimizar processos e impulsionar o crescimento empresarial.
“Há falta de habilidades em IA. Nós temos o desafio de escassez de profissionais que sejam mais qualificados, o que limita sua capacidade de aproveitar os benefícios dessa solução. Além disso, a complexidade com a tecnologia e a incerteza sobre o retorno do investimento de fato também dificulta a adoção”, explica Accarini.
Esta análise sugere que, além da natural resistência à mudança, as organizações enfrentam desafios práticos significativos na implementação de soluções de IA. A escassez de talentos especializados, a complexidade técnica das soluções disponíveis e a dificuldade em quantificar o retorno sobre o investimento criam barreiras substanciais que vão além de simples resistência cultural.
Esses obstáculos são particularmente relevantes para empresas de médio e pequeno porte, que podem não dispor dos recursos necessários para investir em tecnologias avançadas e na capacitação de suas equipes. No entanto, mesmo grandes corporações enfrentam desafios na integração efetiva dessas tecnologias em seus processos existentes.
Aplicações Práticas: Como as Empresas Estão Utilizando a IA
Apesar das barreiras identificadas, as organizações que já adotaram tecnologias de IA estão explorando diversas aplicações práticas para otimizar seus processos internos. O estudo da Korn Ferry identificou que, entre as empresas que utilizam inteligência artificial generativa, as principais aplicações estão concentradas na eficácia de processos (59%) e na implementação de chatbots internos (59%).
Outras aplicações significativas incluem a realização de pesquisas internas (48%), análise preditiva (42%) e redução de vieses (23%). Esses dados sugerem que as organizações estão priorizando aplicações que oferecem ganhos imediatos de eficiência e melhorias na experiência do colaborador, antes de avançar para usos mais sofisticados e transformadores.
A concentração em aplicações de eficiência de processos e chatbots internos reflete uma abordagem pragmática, focada em resultados tangíveis e de implementação relativamente direta. Essas aplicações permitem que as organizações experimentem os benefícios da IA sem necessariamente realizar transformações radicais em seus modelos de negócio ou estruturas organizacionais.
A análise preditiva, utilizada por 42% das empresas que adotaram IA, representa um passo mais avançado, permitindo que as organizações antecipem tendências e tomem decisões mais informadas com base em dados históricos e padrões identificados. Já a aplicação para redução de vieses (23%) indica uma preocupação crescente com questões de diversidade e equidade, utilizando a tecnologia para minimizar preconceitos inconscientes em processos de tomada de decisão.
O Presente e o Futuro da IA nos Processos de RH
O levantamento da Korn Ferry também se aprofundou na análise do uso atual e do potencial futuro da inteligência artificial generativa especificamente nos processos de Recursos Humanos. Os respondentes classificaram o nível de utilização atual e o potencial futuro em uma escala de 1 (muito baixo) a 5 (muito alto) para diversos setores dentro da área de RH.
Os resultados revelam que, no momento presente, a maioria dos setores de RH ainda apresenta níveis muito baixos de utilização de IA. Áreas como saúde e segurança no trabalho (56%), gestão de mudança e desenvolvimento organizacional (55%), diversidade e inclusão (58%), comunicação interna (45%) e análise de dados/people analytics (43%) foram classificadas predominantemente no nível mais baixo de adoção.
Este cenário atual contrasta significativamente com a percepção do potencial futuro dessas tecnologias. Quando questionados sobre as perspectivas futuras, os respondentes demonstraram um otimismo considerável quanto ao potencial de transformação que a IA pode trazer para os processos de RH.
A disparidade entre o uso atual e o potencial percebido sugere que, embora as organizações reconheçam o valor transformador da IA para a área de Recursos Humanos, ainda existem barreiras significativas a serem superadas para que esse potencial seja plenamente realizado. Essa lacuna entre percepção e implementação representa tanto um desafio quanto uma oportunidade para profissionais e organizações que buscam liderar a transformação digital no campo de gestão de pessoas.
Análise de Impacto: Transformação sem Disrupção
Um dos aspectos mais relevantes revelados pelo estudo da Korn Ferry é a natureza evolutiva, e não disruptiva, da transformação impulsionada pela IA no ambiente corporativo. O fato de 90% das empresas não planejarem reduzir suas estruturas, mesmo reconhecendo o potencial transformador da tecnologia, sugere uma abordagem de integração e complementaridade, em vez de substituição.
Esta perspectiva contraria narrativas alarmistas sobre desemprego tecnológico em massa e sugere um futuro onde humanos e máquinas trabalham em colaboração, cada um contribuindo com suas forças únicas. As máquinas assumem tarefas repetitivas, análises de grandes volumes de dados e processamento de informações, enquanto os humanos se concentram em atividades que exigem criatividade, inteligência emocional, pensamento crítico e tomada de decisões complexas.
No entanto, essa transformação não ocorre sem desafios. A escassez de profissionais qualificados em IA, mencionada por Accarini, representa um gargalo significativo que pode limitar a velocidade e o alcance dessa transformação. Organizações que desejam liderar nesse novo cenário precisarão investir não apenas em tecnologia, mas também no desenvolvimento de talentos e na criação de uma cultura organizacional que valorize a aprendizagem contínua e a adaptabilidade.
Além disso, a incerteza sobre o retorno do investimento em tecnologias de IA representa um desafio para justificar os investimentos necessários, especialmente em um ambiente econômico volátil. As organizações precisarão desenvolver métricas mais sofisticadas para avaliar o impacto dessas tecnologias, considerando não apenas reduções de custo imediatas, mas também ganhos de produtividade, melhorias na experiência do cliente e do colaborador, e vantagens competitivas de longo prazo.
Perspectiva Comparativa: Brasil no Contexto Global
Embora o estudo da Korn Ferry não apresente uma comparação explícita entre o Brasil e outros países, é possível contextualizar seus achados no cenário global de adoção de IA. Pesquisas internacionais têm consistentemente mostrado que a adoção de tecnologias avançadas de IA varia significativamente entre regiões e setores, com economias mais desenvolvidas geralmente liderando em termos de implementação.
No contexto latino-americano, o Brasil frequentemente se posiciona como um dos líderes em adoção de novas tecnologias, particularmente no setor financeiro e de serviços. No entanto, quando comparado a mercados como Estados Unidos, China e alguns países europeus, o país ainda enfrenta desafios significativos relacionados à infraestrutura tecnológica, disponibilidade de talentos especializados e investimentos em pesquisa e desenvolvimento.
A resistência à adoção de IA identificada no estudo da Korn Ferry (74% das empresas não utilizam ferramentas de IA generativa) não é exclusiva do Brasil, mas reflete um fenômeno global onde a implementação prática ainda não acompanha o entusiasmo teórico. Mesmo em economias avançadas, muitas organizações ainda estão nos estágios iniciais de sua jornada de transformação digital.
No entanto, a escassez de profissionais qualificados mencionada por Accarini pode ser particularmente aguda no contexto brasileiro, onde o sistema educacional ainda está se adaptando às demandas da economia digital. Iniciativas de capacitação e desenvolvimento de talentos em IA, tanto no setor público quanto privado, serão cruciais para que o país não fique para trás nessa revolução tecnológica.
Perguntas Frequentes Sobre IA e o Futuro do Trabalho
A IA realmente eliminará empregos em larga escala?
O estudo da Korn Ferry sugere que o impacto da IA nos níveis de emprego pode ser menos dramático do que algumas previsões alarmistas sugerem. Com 90% das empresas indicando que não planejam reduzir suas estruturas mesmo com a adoção crescente de IA, parece haver uma tendência de utilizar essas tecnologias para complementar e potencializar o trabalho humano, em vez de substituí-lo completamente. No entanto, é importante reconhecer que o impacto variará significativamente entre setores e funções. Tarefas altamente repetitivas e baseadas em regras são mais suscetíveis à automação, enquanto funções que exigem criatividade, inteligência emocional e pensamento crítico tendem a ser mais resistentes. O desafio para profissionais e organizações será adaptar-se a essa nova realidade, desenvolvendo habilidades complementares às capacidades da IA e encontrando formas de criar valor em colaboração com essas tecnologias.
Quais são os principais obstáculos para a adoção de IA nas empresas?
Segundo o estudo da Korn Ferry e as observações de Rodrigo Accarini, vários fatores contribuem para a lenta adoção de IA nas organizações. A escassez de profissionais qualificados representa um gargalo significativo, limitando a capacidade das empresas de implementar e gerenciar soluções de IA efetivamente. A complexidade técnica das soluções disponíveis também representa um desafio, especialmente para organizações sem departamentos de TI robustos. Além disso, a dificuldade em quantificar o retorno sobre o investimento em tecnologias de IA cria barreiras para a aprovação de projetos, particularmente em ambientes corporativos focados em resultados de curto prazo. Fatores culturais também desempenham um papel importante, com resistência à mudança e preocupações sobre segurança de dados e privacidade frequentemente citados como obstáculos. Para superar esses desafios, as organizações precisam adotar uma abordagem estratégica, começando com projetos piloto bem definidos, investindo em capacitação e criando uma cultura que valorize a inovação e a experimentação.
Como as empresas estão utilizando a IA na prática?
O estudo da Korn Ferry identificou que, entre as organizações que já adotaram tecnologias de IA, as principais aplicações estão concentradas na eficácia de processos (59%) e na implementação de chatbots internos (59%). Outras aplicações significativas incluem a realização de pesquisas internas (48%), análise preditiva (42%) e redução de vieses (23%). Na prática, isso se traduz em automação de tarefas repetitivas, como triagem inicial de currículos em processos seletivos, análise de grandes volumes de dados para identificar tendências e padrões, personalização de experiências de aprendizado e desenvolvimento, e suporte ao colaborador através de assistentes virtuais. Algumas organizações mais avançadas estão utilizando IA para otimizar a alocação de recursos, prever tendências de mercado e identificar riscos potenciais antes que se materializem. No entanto, o estudo sugere que muitas empresas ainda estão nos estágios iniciais de exploração dessas possibilidades, focando em aplicações de menor complexidade e risco.
Quais ferramentas de IA são mais utilizadas pelas empresas?
Entre as organizações que já incorporaram ferramentas de IA em seus processos, o ChatGPT lidera com 62% de adoção, seguido pelo Microsoft Copilot com 52%. Outras ferramentas como Viva (4%) e Bard (1%) apresentam taxas de utilização significativamente menores, enquanto 26% dos respondentes indicaram o uso de outras soluções não especificadas. A predominância do ChatGPT e do Copilot reflete a acessibilidade e versatilidade dessas ferramentas, que podem ser aplicadas a uma ampla gama de casos de uso sem necessidade de conhecimentos técnicos avançados. O ChatGPT, em particular, ganhou popularidade por sua interface intuitiva e capacidade de gerar conteúdo, responder perguntas e auxiliar em diversas tarefas de processamento de linguagem natural. Já o Microsoft Copilot, integrado ao ecossistema Office 365 amplamente utilizado por empresas, oferece assistência contextual em aplicativos como Word, Excel e PowerPoint, facilitando sua adoção em ambientes corporativos já familiarizados com essas ferramentas.
Como preparar a força de trabalho para um futuro com IA?
Preparar a força de trabalho para um futuro onde a IA desempenha um papel cada vez mais significativo requer uma abordagem multifacetada. Primeiramente, é essencial investir em programas de capacitação e desenvolvimento que permitam aos colaboradores adquirir habilidades complementares às capacidades da IA, como pensamento crítico, criatividade, inteligência emocional e resolução de problemas complexos. Igualmente importante é fomentar uma cultura de aprendizagem contínua, onde os profissionais são incentivados a se manter atualizados sobre novas tecnologias e suas aplicações. As organizações também devem considerar a requalificação de profissionais cujas funções são mais suscetíveis à automação, preparando-os para assumir novos papéis que emergem com a transformação digital. Além disso, é fundamental promover a alfabetização digital em todos os níveis da organização, garantindo que todos os colaboradores tenham um entendimento básico de como a IA funciona e como pode ser utilizada para potencializar seu trabalho. Por fim, líderes devem modelar uma atitude positiva em relação à tecnologia, demonstrando como a IA pode ser uma aliada, e não uma ameaça, no desenvolvimento profissional e organizacional.
Navegando o Futuro do Trabalho na Era da IA
O estudo “Tendências de RH 2024-2025” da Korn Ferry oferece insights valiosos sobre como as organizações estão navegando a transformação impulsionada pela inteligência artificial. Contrariando narrativas alarmistas sobre desemprego tecnológico em massa, os dados sugerem uma abordagem mais evolutiva do que disruptiva, com 90% das empresas indicando que não planejam reduzir suas estruturas mesmo com a adoção crescente de IA.
No entanto, o estudo também revela desafios significativos na implementação dessas tecnologias. A escassez de profissionais qualificados, a complexidade técnica das soluções disponíveis e a dificuldade em quantificar o retorno sobre o investimento criam barreiras que limitam a velocidade e o alcance da transformação digital. Esses obstáculos são refletidos no baixo nível atual de adoção, com 74% das organizações relatando não utilizar qualquer ferramenta de inteligência artificial generativa em suas operações cotidianas.
Apesar desses desafios, há um reconhecimento claro do potencial transformador da IA, particularmente nos processos de Recursos Humanos. A disparidade entre o uso atual e o potencial percebido sugere que estamos apenas no início de uma jornada de transformação que promete redefinir fundamentalmente como as organizações operam e como o trabalho é realizado.
Para navegar com sucesso esse futuro emergente, organizações e profissionais precisarão adotar uma mentalidade de adaptabilidade e aprendizagem contínua. As empresas que conseguirem superar as barreiras iniciais de implementação, investindo não apenas em tecnologia, mas também no desenvolvimento de talentos e na criação de uma cultura que valorize a inovação, estarão melhor posicionadas para capitalizar as oportunidades oferecidas pela IA.
Como observa Accarini, “Embora a inteligência artificial seja uma tendência inevitável, as empresas demonstram resistência em adaptá-la aos seus processos. É fundamental oferecer informações e suporte para auxiliar as empresas na superação desses desafios e aproveitar os benefícios da IA”. Esta perspectiva equilibrada, reconhecendo tanto os desafios quanto as oportunidades, oferece um caminho promissor para organizações que buscam prosperar na era da inteligência artificial.
Em última análise, o impacto da IA no futuro do trabalho será determinado não apenas pelo potencial da tecnologia em si, mas pela forma como escolhemos implementá-la e integrá-la em nossas organizações e sociedade. O estudo da Korn Ferry sugere que, com a abordagem correta, podemos criar um futuro onde humanos e máquinas trabalham em colaboração, cada um contribuindo com suas forças únicas para criar organizações mais eficientes, inovadoras e humanas.
Prepare sua organização para o futuro da IA: invista em capacitação, desenvolva uma estratégia clara de implementação e crie uma cultura que valorize a inovação e a colaboração entre humanos e tecnologia.